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A utilização da Inteligência Natural no modo “deixa solto”

 

Vou explicar aqui como é o processo de elaboração de um desenho gerado por IN, Inteligência Natural. O desenho foi feito durante uma reunião, com lápis, numa folha de papel A4 que estava na mesa. No caso, não houve “prompt”. A coisa foi sendo rabiscada aos poucos, no modo “piloto automático”, meio sem pensar, e não tinha nada a ver com o assunto da reunião. A primeira coisa que risquei foi aquela espiral que está no alto da folha, e que um pouco depois se transformou num quepe de militar. Em seguida, rabisquei a cara do sujeito e o corpo, vestindo um uniforme todo engalanado, cheio de enfeites, que sempre são bons de desenhar. Enquanto esses rabiscos iam acontecendo, eu continuava a participar da reunião. A figura do militar ficou ali sozinha mas, depois de um tempo, me deu vontade de desenhar outro personagem para participar da cena e preencher o espaço vazio no papel. Então apareceu a figura de um velho hippie, com o punho fechado, em sinal de protesto. Mais uma vez, o desenho foi deixado de lado durante um tempo. E aí, de repente, do nada, apareceu na minha cabeça a imagem de uma cenoura sendo usada como punhal. Só tive que encaixar a cenoura no punho fechado do velho hippie. Aí “aconteceu a mágica”, como dizem os palestrantes especializados em criatividade…A imagem finalizada se tornou um retrato tragicômico dos embates entre o pacifismo e a boçalidade militarista. Nada disso foi pensado naquela hora, mas é claro que, no fundo, eu sou esse cara que empunha a cenoura.

*Isso foi publicado no zine digital TREVOUS. http://trevo.us

 

Quantas vidas tem um desenho?

Este texto foi publicado na Folha de S. Paulo em 2018, mas infelizmente tenho que voltar ao assunto…

Na revista Pif-Paf, lançada por Millôr Fernandes em 1964, tinha sempre uma seção chamada “Pif-Paf analisa uma piada”, onde um cartum era totalmente dissecado e interpretado, em todas as suas possibilidades, com direito a altas divagações, na busca insaciável dos verdadeiros significados da obra. E o texto sempre começava com a palavra “evidentemente”. Hoje tenho a oportunidade de fazer uma coisa parecida, mas a cobaia do experimento será um desenho que eu mesmo fiz.

Evidentemente, trata-se de um desenho de humor cujo alvo é a figura patética de um obsessivo usuário das redes sociais. E, como eu sou o autor, não preciso perder tempo com hipóteses sobre as verdadeiras motivações da obra. Posso afirmar, com certeza absoluta, que este desenho foi feito para ser a ilustração de um texto do Renato Terra, publicado na revista Piauí, edição 66, em março de 2012.

Tempos depois, em 2014, o desenho foi publicado de novo, dessa vez num livro de humor gráfico chamado “A Arte de Zoar”. E aí, mesmo sem o acompanhamento do belo texto de Renato Terra, acho que a ilustração ainda conseguiu cumprir sua função de fazer surgir um sorriso no rosto do leitor.

Agora, em março de 2018, exatamente seis anos depois da primeira aparição, estou publicando mais uma vez a mesma imagem, só que neste momento o desenho ganhou um novo sentido. Depois da monumental cagada em que se envolveu o Facebook, a leitura agora é outra.

Evidentemente, trata-se de um desenho satírico feito para retratar a maneira descuidada e destrambelhada com a qual a plataforma digital azulzinha trata seus fiéis usuários e suas valiosas informações.

Daqui a alguns anos, depois da extinção do Facebook, se o planeta também não for extinto, e se por caso ainda existir por aí alguma cópia deste desenho, talvez algum pesquisador, especialista na iconografia do humor arcaico, venha a perder seu tempo tentando decifrar o misterioso significado desse troço. E talvez escreva alguma coisa, começando assim: “Evidentemente…”